segunda-feira, 7 de junho de 2010

VOCÊ TEM SEDE DO QUÊ?


Crônica de uma de nossas bolsistas, Clotilde Zingali, publicada no Jornal A Notícia, caderno ANEXO pg.03 em 25 de março de 2010.


VOCÊ TEM SEDE DO QUÊ? 



Neste mês de março que quase finda, comemorou-se o Dia Nacional da Poesia (14) e o dia Mundial da Água (22). Já foi, mas sempre é tempo para falar de coisas importantes para a nossa vida, certo? E eu, após a descoberta das datas, achei interessante misturar as duas. Misturar coisas às vezes é bom. “Banana com a comida. Geléia doce de pimenta na carne. Pizza de chocolate. Peixe ao molho de carambola. Estar de frente para o mar e morrer de sede”. Água é fonte da vida. Penso que com poesia é assim também. Aliás, poesia é até verbo. Pode e deve ser usada no imperativo: POEME-SE. Não importa quem somos, o que fazemos, onde vivemos. Da água certamente, dependemos. E poesia? Bem, a vida pode ficar melhor com poesia. No entanto, por maior que seja a importância da água, as pessoas continuam poluindo os rios e suas nascentes, esquecendo o quanto ela é essencial. E poesia? Bem, muita gente se esquece dela ou nem se lembra e acaba poluindo a vida de coisas que não fazem a alma delirar. A água é, provavelmente, o único recurso natural que tem a ver com aspectos diversos da civilização humana, desde o desenvolvimento agrícola e industrial aos valores culturais e religiosos arraigados na sociedade. É um recurso fundamental, seja como componente bioquímico de seres vivos, como meio de vida de várias espécies vegetais e animais, como elemento representativo de valores sociais e culturais e até como fator de produção de vários bens de consumo. Os números são sempre alarmantes, mas sempre mais alarmante é a situação precaríssima que só aumenta e permanece sempre verdade. Alguns deles: mais de 1 bilhão de pessoas no mundo não têm acesso à água potável, quase 3 milhões de pessoas no planeta não têm acesso a serviços de saneamento básico e cerca de 6 mil crianças morrem diariamente em função de doenças decorrentes de saneamento deficiente ou de sua completa falta. E de acordo com a ONU, até 2025, se os atuais padrões de consumo se mantiverem, duas em cada três pessoas no mundo vão sofrer escassez moderada ou grave de água. Isso sem contar a contaminação de rios com mercúrio, agrotóxicos e esgotos domésticos e industriais. Não tem poesia nenhuma nisso. Não há verbo que delire diante disso, senão o simples e significativo: PARE! Pare de usar sem pensar. Se a água existe desde que o mundo é mundo e durou até agora, definitivamente não é porque ela é infinita. Proclamada com o objetivo de atingir todos os indivíduos, todos os povos e todas as nações do planeta, a Declaração Universal dos Direitos da Água foi feita para que todos os homens, tendo-a sempre presente no espírito, se esforcem, através da educação e do ensino, para respeitar os direitos e obrigações anunciados. E assumam, com medidas progressivas de ordem nacional e internacional, seu reconhecimento e sua aplicação efetiva. Pra terminar de misturar, lembro a música de Tom Jobim, “Águas de março”: uma letra musical repleta de imagens. Que nem a poesia. Poesia cheia de brasilidade. Um fluxo onde os seres são como pau, pedra, caco de vidro, nó na madeira, peixe, fim do caminho e outros tantos numa metáfora especial da vida e de seu caminho rumo à morte (mas que pode renascer de maneiras tantas). Que nem a água. Das chuvas que iniciam e acabam. Ou das fontes. Que iniciam e acabam. Pra finalmente a imagem da "água" como "promessa de vida". Tem muitas outras relações para se estabelecer. De poesia, de morte e de vida. Parafraseando o que diz a ONU sobre a importância de se preservar a água, eu diria: A água é nossa seiva. Seiva da nossa vida. Até da poesia. Que corre lírica nas veias, afina o sangue e pulsa. E deve ser manipulada com cuidado. Que nem a palavra no poema. O equilíbrio depende de onde os ciclos começam, que é igual “aonde” o verbo pega delírio no poema. A água, como a palavra, não é somente uma herança dos que vieram antes, mas também um empréstimo para aqueles que virão. E não é doação a fundo perdido da natureza. É rara. Não deve ser desperdiçada, nem poluída, nem envenenada. Então, leitor, poeme-se nessa onda. Isso matará a sede do mundo.

Um comentário:

  1. Linda!!! Achei de muita pertinência. Realmente, precisamos pensar com mais seriedade sobre a questão da finitude e fragilidade desse recurso natural que nos garante a vida.
    Nelma Baldin - Professora (Univille)

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